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A mostrar mensagens de março, 2020

Almoço de domingo

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Por toda a eternidade seja louvado o deus que criou as saladas. Com o seu variegado e colorido espírito, salvam o almoço de domingo.

Não entres tão depressa nessa noite escura

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Sei que não podes estar comigo nesta noite escura. Nem eu te vou telefonar à moda antiga para rir e chorar contigo. Para te ouvir falar do teu dia de teletrabalho. Para te perguntar se já leste o livro que te emprestei. Que novos músicos tens descoberto. Se já encontraste uma paixão. Sei que tens uma família para cuidar, uma mãe e um pai, uma avó. E quem, hoje , cuida de uma mãe, cuida do mundo. E quem cuida do mundo, cuida de mim também, hoje o teu mundo é a tua mãe. E a tua mãe é o meu mundo. E tudo isso que é a tua mãe abraça-me nesta noite tão escura, tão escura, em que não há abraços sobre a Terra.  Não há telefones do século XX. Mas o teu cuidar, o teu cuidar de filho, é o amor maior que alguma Terra já viu. E faz-me ser absolutamente abraçado pela escrita. 

Nas tuas mãos entrego o meu espírito

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Tudo de bom e de mau me tem acontecido na vida. O beijo, o soco. A literatura, a ignorância. A ternura e a ofensa. O desprezo, o olhar. Por acção das minhas mãos, manípulos do corpo e da alma, ou por obra de mãos de outrem. Hoje vítima, amanhã carrasco. Anjo? Bruto? Homem (como no poema de Torga). Síntese, antítese. Mas o problema é quando a acção boa ou má não está nas minhas mãos nem nas do próximo? Que podem as mãos de um homem assim?

Haver de + infinitivo

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Hei-de ir ter contigo aos Aliados. E tu hás-de ir ter comigo aos Aliados. Havemos de ir ter connosco aos Aliados.

Estado de emergência

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Em dia de emergência, às cinco e meia da tarde, hora mais carente, mais animal, mais felina, imagino-te imaginando-me, penso em tis , sonho com todas as pessoas que beijei, não beijei, irei beijar, nunca poderei beijar. Mas tenho medo de beijar a minha própria mão direita. E nego-me, não dou um beijo a mim mesmo.

Vinte, vinte

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Talvez por causa de vírus biológicos, analógicos e digitais, não tenho tido nas últimas semanas o trabalho que tinha ao sábado. Ontem, outra vez, mais uma vez. À tarde, fui para a rua ler poesia. Longe de televisões e previsões. Para ganhar a vida, literalmente, para ganhar a vida. Um homem, tão poeta e prosador quanto eu e ele, deu-me, assim do nada, como puta poesia*, vinte euros, vinte vírus, ainda no início do triste espectáculo feliz. Por vinte euros, se eu fosse crente, acreditava. E nenhum vírus me matava. *Queria antes escrever pura e a escrita automática escreveu o que quis.